INTRODUÇÃO
O objetivo
de conseguir criar canários de canto campeões contém dois aspetos fundamentais:
o primeiro consiste em conseguir canários com um genótipo adequado, para isso temos que partir
de pais com um genótipo definido e linhas previamente bem estabelecidas e conseguidas com um processo de acasalamento e seleção correto, uma vez conseguido tudo isto, é necessário
realizar um adequado processo de aprendizagem do canto com os novos machos, que
lhe vai dar a possibilidade, já adultos, de conseguirem, com o seu timbre de
voz eleito e umas faculdades notáveis, interpretarem uma canção bela e meritória. O conhecimento que os criadores de Timbrado tem sobre esta aprendizagem é fundamentalmente empírica, baseada em experiências de criadores mais maduros e com
uma longa e vasta dedicação a estes pássaros.
O essencial deste conhecimento é fundamentado,
na minha maneira de ver, e também um facto aceite por todos, de que maneira os canários herdam o timbre
e outras faculdades de voz dos seus progenitores? Existem
duas hipóteses controvérsias: uns dizem que a canção, com mais ou menos riqueza silábica e umas
pautas musicais concretas, deve ser uma manifestação espontânea da dotação
genética em conjunto com o meio ambiente, outros dizem que uma canção para
ser de qualidade deve ser aprendida e
imitada de exemplares adultos que com eles convivem durante a fase de aprendizagem. Os primeiros não
utilizam professor para que o canto seja,
como se disse, manifestação dos seus
genes, e não da aprendizagem que, para além
disso, se poderá perder no ano seguinte, enquanto que os segundos fazem
conviver os jovens canários com
exemplares adultos que lhes podem ensinar a cantar com perfeição uma determinada canção.
Parece também aceite por todos
os criadores que o canário aprende do meio ambiente em que se
rodeia desde o seu nascimento até ao mês de Novembro, em que deixa de
aprender, "cerrando o canto", apresentando
nessa altura uma canção estável. Normalmente, a meados ou
finais de Outubro, os jovens canários separam-se dos seus irmãos e são colocados individualmente em gaiolas de canto para serem ouvidos pelo criador, agrupados e treinados para depois serem apresentados a concurso, de Novembro a Janeiro, como equipas
ou individuais. O treino consiste, essencialmente,
em mantê-los num ambiente com pouca luz e mudá-los, periodicamente e durante períodos curtos de tempo, a um sitio iluminado para que se acostumem a
cantar quando lhes incidir a luz para depois
cantarem no momento em que forem avaliados
pelo juiz. É com alguma frequência, que
alguns criadores administram testosterona
em gotas durante este período de treino. Isto acontece com alguma frequência, derivado à realização de
concursos logo cedo, no final de Outubro
a meados de Novembro, obrigando os criadores a colocar os seus canários, em gaiolas de canto, antes do
previsto, por vezes a meio de Agosto e meados de Setembro, podendo, deste
modo, alterar o processo natural de aprendizagem.
É sabido que periodicamente e todos
os anos, durante a muda, entre os meses
de Verão a Outono, o canário deixa de cantar com mestria para
recuperar novamente no Inverno o seu canto que pode ser igual ao que tinha antes da muda ou, um pouco diferente. Em relação a este assunto também existem pontos de vista diferentes, aqueles
que utilizam professor dizem que os seus canários não modificam o canto nos anos seguintes, porque ouviram e aprenderam enquanto eram
novos de outros exemplares adultos e de qualidade, os que não utilizam professor dizem que o canto dos seus canários é espontâneo dos seus genes
e que não aprenderam nada à margem da sua dotação genética.
O presente artigo pretende rever e sistematizar os conhecimentos empíricos utilizados na aprendizagem do canto
dos nossos canários . O método consiste em consultar
criadores de distintas tendências, baseados na sua larga experiência, e também através da bibliografia
existente na base de dados de MEDLINE da National Library of Medicine. U.S.A.
Desenvolvimento dos seguintes temas:
Fases, Controlo hormonal,
Controlo neurológico da aprendizagem, Imitação de um modelo adulto e Conclusões.
FASES DE APRENDIZAGEM:
Antes de entrar nesta
polémica, revemos os estudos existentes sobre a forma em como os canários conseguem cantar com destreza a sua canção, desde o seu nascimento até
à fase adulta.
A ave canta para se comunicar com os seus semelhantes,
estabelecer o seu território de criação e os machos atrair as
fêmeas.
Desde a antiguidade é conhecida a capacidade que alguns pássaros tem para imitar sons, contudo foi W. H. Torpes que demonstrou, nos anos 50, que os pássaros cantores exerciam esta capacidade
de forma habitual, pois tem a capacidade de aprender a cantar da
mesma forma que os humanos tem em aprender
a falar, imitando formas e modelos que outros adultos
lhes proporcionam. Observou que os tentilhões aprendiam a cantar de exemplares
adultos uma só vez na sua vida, justamente antes de conseguirem a sua maturidade sexual, e posteriormente, perdiam
para sempre esta capacidade de aprender. O período em que podem aprender chama-se "Período Crítico" da aprendizagem. Não
acontece de igual modo com os canários, já
que estes mudam de canto de um ano para
o outro e são, deste modo, aprendizes ilimitados no tempo. Todos os anos tem um " Período Crítico" de aprendizagem
antes de chegar a Primavera, desde os finais do Outono a princípios da Primavera .
O canto dos canários evolui desde o seu nascimento até à sua maturidade sexual, passando por fases:
a) Os primeiros sons que o canário
emite, desde que nasce até à separação dos seus pais, final da quarta semana, são uns chilidos agudos que levam os pais a
dar-lhes de comer.
b) Os primeiros ensaios rudimentares do canto começam na quinta semana até final do segundo mês de vida, denominada de "sub-canção". São
gorjeios de pouco volume, e de estrutura
variável, emitidos
quando o pássaro está como que a dormitar, chamada a "revisão" para os criadores. Parecem
representar uma fase prematura da prática
vocal, de onde se originará o repertório
de sons completos que usará para a sua comunicação.
c) Uma canção mais estruturada, próxima já do canto dos adultos mas ainda bastante variável, dá lugar à
"canção plástica", a sua duração é de 6 meses,
aproximadamente , a partir do terceiro mês de vida até alcançar
a maturidade sexual, aos sete
ou oito meses. Como veremos mais adiante,
durante a primeira metade desta fase, da
canção plástica, os tamanhos dos núcleos
cerebrais que controlam o canto aumentam
pouco mas, durante a segunda metade (do sexto ao oitavo mês de vida), produz-se um aumento espetacular
no tamanho do centro vocal superior. No final desta fase, o canário já pode vocalizar 90% das sílabas que irá usar quando
for adulto.
d) No começo da primeira fase do acasalamento, o canário transforma as
sílabas em estereótipos e expressa uma "canção estável" com uma
riqueza silábica concreta e umas pautas musicais fixas e estereotipadas, o "encerramento do canto" para os criadores. Não parece resultar fácil a consolidação desta "canção estável",
se considerarmos que investem nela vários meses de prática, correspondentes à fase de "canção plástica".
e) No entanto, esta canção também não é a canção ou repertório silábico definitivo para toda a vida do canário. Todos os anos depois da muda, no final do Verão e durante o Outono, o pássaro perde a mestria de executar a canção aprendida voltando uma vez mais instável, igual à "canção plástica" dos jovens. Durante este período, haverá sílabas dominadas que se esqueceram, enquanto que outras novas se incorporam no seu canto de uma forma estável, que serão expressadas na Primavera seguinte, assim, os canários machos adultos podem desenvolver um repertório de sílabas novas no seu canto. A transição da "canção estável" à "plástica", e desta novamente à "estável", repete-se anualmente no canário adulto.
e) No entanto, esta canção também não é a canção ou repertório silábico definitivo para toda a vida do canário. Todos os anos depois da muda, no final do Verão e durante o Outono, o pássaro perde a mestria de executar a canção aprendida voltando uma vez mais instável, igual à "canção plástica" dos jovens. Durante este período, haverá sílabas dominadas que se esqueceram, enquanto que outras novas se incorporam no seu canto de uma forma estável, que serão expressadas na Primavera seguinte, assim, os canários machos adultos podem desenvolver um repertório de sílabas novas no seu canto. A transição da "canção estável" à "plástica", e desta novamente à "estável", repete-se anualmente no canário adulto.
CONTROLO HORMONAL DA APRENDIZAGEM
São muitos os fatores meio ambientais que podem influenciar na aprendizagem do canto dos canários, como os sons que ouvem, a luminosidade do sítio
onde estão, a alimentação,
a companhia de outros canários
adultos ou mesmo novos, e outros que provavelmente desconhecemos. Além disso,
esta aprendizagem estacional vem determinada pelo equilíbrio hormonal, visto que as fases de adquirir novas sílabas estão precedidas por uma menor concentração no sangue de testosterona, hormona sexual masculina. Efetivamente, o
canto de um canário carateriza-se pelo número de sons ou sílabas distintas que
contém determinadas pautas musicais, quando o canário está na fase de canção plástica costuma incorporar novas sílabas no seu canto. Esta incorporação
coincide com um aumento do tamanho dos núcleos cerebrais controladores do canto, e é precedida por uma caída do nível de
testosterona no sangue, de forma inversa, quando os níveis de
testosterona no sangue são altos e o canário se encontra na fase de canção estável, incorpora poucas sílabas no seu canto.
Portanto, pode-se afirmar, que a fase de canção plástica, que vai
do começo do terceiro mês de vida até finais do sétimo ou oitavo mês de vida, aproximadamente desde Maio a Novembro,
é o "período crítico" da aprendizagem dos canários, sobretudo durante
os meses de Agosto, Setembro e Outubro (ver Figura 2). Durante este tempo os canários
dispõem de uma capacidade natural para
aprender sílabas e pautas musicais, superior ao resto dos meses do ano.
Em relação ao parágrafo
anterior pode-se deduzir que se encurtarmos a duração do "período crítico" de aprendizagem
ou fase de canção plástica, o canário
terá menos tempo para aprender sílabas novas
e conseguirá uma canção estável com mais pobreza silábica. Se dermos testosterona
exógena aos canários durante o período do
terceiro ao sétimo mês, aproximadamente de Maio a Outubro, elevamos os níveis de plasma até ao "pico", igual ao alcançado
em Novembro, podemos, desta maneira, acelerar a maturidade sexual, conseguindo a
fase de canção estável mais cedo, à
custa de encurtarmos o "período crítico" de aprendizagem. Procedendo ao enjaulamento (colocação nas gaiolas de canto) individual dos jovens machos em épocas muito precoces, como a meados de Agosto a meados de Setembro, vamos desta forma acelerar a sua maturidade sexual encurtando também a duração deste "período crítico". Estes dois
procedimentos, o aporte de testosterona exógena e o enjaulamento (colocação nas
gaiolas de canto) precoce dos novos machos, é efetuado por alguns criadores que são obrigados a fazê-lo para irem a concurso mais
cedo, em finais de Outubro a primeiros de Novembro. Mas, além de encurtar a duração do "período crítico", o enjaulamento (colocação nas gaiolas de canto) individual precoce ou o aporte excessivo de
testosterona exógena poderão diminuir a capacidade
de aprendizagem durante os meses mais produtivos deste período como são os meses de Agosto
a Outubro que é quando mais sílabas podem
aprender os canários. Como se nota, a realização de concursos de canto muito cedo pode contribuir para a pobreza silábica no canto dos
canários que participam nesses concursos. Além disso, temos que estar conscientes que o enjaulamento (colocação nas gaiolas de canto)
individual precoce dos canários faz com que a sua aprendizagem durante este tempo se realiza em solidão, enquanto
que se enjaular (colocar na gaiola de canto) normalmente, desde meados de Outubro
a meados de Novembro, a aprendizagem poderá enriquecer-se com a companhia de outros canários
machos, assim ao ter às escuras os novos machos tão cedo pode alterar qualitativamente
o processo de aprendizagem.
No entanto, pondo-se a hipótese que, se aportará testosterona exógena durante
a fase da canção plástica (apenas com o objetivo de restaurar os níveis baixos desta hormona), evitamos possíveis carências durante os meses da "canção plástica" e talvez
conseguir estimular o crescimento dos núcleos "CVS" e "AR"
que dispõem de maior numero de neurónios, dando lugar a uma canção com maior
riqueza silábica sem adiantar a maturidade
sexual e, portanto, sem encurtar a duração do "período crítico".
CONTROLO NEUROLOGICO DA APRENDIZAGEM
Ainda que o canto do canário se execute no seu órgão canoro, a siringe, é no seu cérebro onde
reside o conteúdo da "canção estável", com a sua composição silábica e padrões
musicais específicos e onde se controla a
sua execução feita pela siringe, como veremos mais à frente.
Em 1976, Fernando Nottebohm, especialista em conduta animal e neurogénese
da Universidade de Rockefeller, NY, U.S.A., identificou grupos de células
cerebrais diferenciadas que controlam o canto dos canários. Estas células são distribuídas num núcleo maior, chamado de "Centro Vocal Superior"
(CVS), que envia prolongações axóniais a outro núcleo chamado centro
"robustus archistriatalis" (RA) e este, por sua vez, envia outras prolongações axóniais
ao
núcleo do "nervo craneal hipoglosso" que abastece os músculos da siringe.
CÉREBRO DO CANÁRIO. A parte superior da
figura representa um corte lateral do cérebro e, a parte inferior, um corte longitudinal da traqueia, da siringe e
dos brônquios principais do canário. O cérebro
tem vários núcleos formados por neurónios especializados em controlar a aprendizagem e a performance do canto. O núcleo maior é o Centro Vocal Superior (CVS),
que envia prolongações nervosas ao núcleo "Robustus archistriatalis"
(M), e este por sua vez envia outras prolongações nervosas ao núcleo do
nervo craneal hipoglosso , que abastece os músculos da siringe, órgão onde se produz o
som. (Retirado de Nottebohm F. From bird
song to neurogéneses. Sci Am 1989 Feb; 260(2 ): 74-9).
Ambos os núcleos estão situados nos
lóbulos frontais do canário,
onde se controlam complexos comportamentos
aprendidos. O CVS parece ser o
responsável por identificar, produzir e memorizar o canto, este núcleo funciona para reconhecer as canções
que percebe, atua como uma memória percetiva
de uma canção modelo, para logo poder imitá-la, se for um macho, ou poder reconhecê-la
e identificar os seus parentes ou parceiro, se for uma fêmea.
Esta informação canora armazenada no CVS é conduzida através das suas prolongações axoniais a outro núcleo AR que se encarrega de desenvolver a destreza motora na execução do canto através do nervo craneal hipoglosso, que abastece os músculos da siringe.
Esta informação canora armazenada no CVS é conduzida através das suas prolongações axoniais a outro núcleo AR que se encarrega de desenvolver a destreza motora na execução do canto através do nervo craneal hipoglosso, que abastece os músculos da siringe.
Comprovou-se que estes centros são
maiores nos canários com um canto mais complexo nos quais este é mais fácil e que aumentam
de tamanho após administração de testosterona e também maiores durante a Primavera, quando os níveis de testosterona são mais altos, são maiores nos machos que nas fêmeas, por outro lado , diminuem
de tamanho após a fase reprodutiva, quando o canto novamente se torna instável e os níveis de testosterona no sangre caem drásticamente.
Também se comprovou que a sobrevivência dos neurónios regenerados que chegam
ao CVS dependem dos níveis suficientes de testosterona, a qual mobiliza os
neurónios mediante um fator neurotrófico
derivado do cérebro (FNDC), já se viu que esta sobrevivência depende do ritmo do que a cada dia canta o canário, já que o uso dos circuitos motores relacionados
com o canto estimulam a liberação do FNDC, afetando neste último caso mais os neurónios do centro RA. Está também comprovado que a
audição de sons ajuda a desenvolver e a potenciar os circuitos auditivos envolvidos na
aprendizagem do cantor.
A descida significativa dos níveis
de testosterona durante os primeiros
meses de vida, de Maio a Julho, coincidem com a aparição da primeira muda e uma
paragem de crescimento no tamanho dos centros
controladores do canto, que se recupera nos meses seguintes, paralelamente a uma recuperação
dos níveis de testosterona e atingindo o seu máximo no mês de Novembro. Tudo
isto ocorre durante a fase de canção plástica associado a um processo de aprendizagem
importante. O tamanho destes centros cerebrais, como se disse,
é máximo durante a Primavera, em que os níveis de testosterona são máximos.
A partir do segundo ano e com uma periodicidade anual, ao acabar a época de criação e durante a seguinte muda, mais concretamente, em
Agosto, os neurónios dos centros
reguladores do canto sofrem um processo de regressão e morrem em grande número causando uma descida no tamanho dos núcleos, coincidindo com una descida importante dos níveis de testosterona. A esta
fase de regressão dos núcleos segue-se outra de regeneração, mediante um processo
de neurogéneses com incorporação de novos neurónios, que é máxima em Novembro, quando os
níveis de testosterona voltam a ser muito altos. Este processo repete-se todos
os anos da mesma maneira.
Coincidindo com estes momentos de crise por descida e recuperação dos níveis
de testosterona com regressão e regeneração dos núcleos cerebrais controladores
do canto, produz-se uma instabilidade e modificação
no canto, podendo-se perder, incorporar
ou modificar sílabas da canção. A canção faz-se novamente estável entre Novembro e Maio, quando o processo de regeneração
dos centros cerebrais está estabilizado. Estes altos e baixos dos tamanhos dos núcleos cerebrais não se observam noutros pássaros cantores os quais aprendem uma canção e lhes dura para toda a vida.
Dado o paralelismo visto entre a capacidade
para aprender e emitir um canto complexo e o tamanho dos núcleos cerebrais, super posição
do número de sílabas aprendidas por mês, tamanho do centro vocal superior (CVS)
regulador do canto e os níveis de testosterona no sangue. Durante a canção
plástica o "período crítico" de aprendizagem do jovem macho observam-se níveis baixos de testosterona: Após uma
descida inicial muito pronunciada desta na primeira metade (Maio a Junho) aparece a
"muda" e pára o crescimento no
tamanho do CVS, produzindo-se logo uma recuperação progressiva durante a
segunda metade (Agosto a Outubro), nesta segunda metade, coincide um crescimento espectacular
no tamanho do CVS por um fenómeno de neurogênese, uma capacidade máxima de aprendizagem
e uma recuperação dos níveis de testosterona, até adquirir níveis máximos em Novembro,
protagonizados pela ação da testosterona durante as fases da subcanção e
fundamentalmente durante a fase da canção plástica, a dependência do canto
manifesta-se de acordo com um correcto
desenvolvimento dos centros cerebrais e, por sua vez, a disponibilidade dos níveis de testosterona
adequados nesses momentos.
Também com periodicidade anual, em
Janeiro, se produz uma descida
importante dos níveis de testosterona no sangue não muito significativa, que não
é acompanhada de instabilidade na canção nem na diminuição do tamanho dos
centros do canto, talvez por um consumo importante desta hormona nos tecidos
para desenvolver os caracteres sexuais como preparação para a época de reprodução
APRENDIZAGEM, NÚCLEOS CEREBRAIS E
TESTOSTERONA NO CANÁRIO
Superposição do número de sílabas aprendidas por mês, tamanho do centro
vocal superior (CVS) regulador do canto e os níveis de testosterona no sangue.
Durante a canção plástica o "período crítico" da aprendizagem do novo
canário observam-se níveis baixos de
testosterona: após uma descida inicial muito pronunciado desta na primeira metade
(Maio a Junho) aparece a "muda" e pára o crescimento no tamanho do CVS; logo se produz uma recuperação progressiva
durante a segunda metade (Agosto a Outubro), nesta segunda metade, coincide um
aumento espetacular no tamanho do CVS por um fenómeno de neurogéneses, uma capacidade
máxima de aprendizagem e uma recuperação dos níveis de testosterona, até adquirir níveis máximos em Novembro.
Ao acabar a época de criação no canário já adulto e a partir de Maio, voltam a baixar os níveis de testosterona, aparece de novo a "muda" surge uma regressão no tamanho do CVS, por se ter perdido alguma parte dos
seus neurónios e também uma perda de mestria na realização do
canto, entrando novamente na fase de canção plástica. Ao se recuperare novamente os níveis de testosterona, esta induz novamente
um processo de neurogéneses, recuperando o tamanho do CVS e entra na fase de canção estável com uma partitura potencialmente destinta por esquecer
ou modificar notas antigas ou adquirir outras novas. Este ciclo repete-se
todos os anos! Fica patente a dependência da aprendizagem do canto durante a canção estável, antes da Primavera, produz-se outra descida importante dos níveis de testosterona que não se repercuta sobre o tamanho do CVS nem sobre a mestria no canto que, talvez, poderá estar relacionado
com um maior consumo desta hormona para a preparação dos tecidos
do macho para a reprodução. (Retirado do
Nottebohm F. From bird song to neurogéneses. Sci Am 1989 Feb: 260 /2): 74-9)
APRENDIZAGEM E IMITAÇÃO DE UM MODELO ADULTO
Parece lógico pensar que, se os canários
tem a capacidade de aprender a cantar imitando o modelo de machos adultos, e esse é o procedimento que estes pássaros seguem
quando vivem em liberdade na natureza já que convivem
e aprendem o canto do pai e outros machos adultos no bando, onde estão inseridos.
Os nossos canários deveriam aprender a
cantar imitando também um macho adulto com
uma canção de qualidade, seguindo o exemplo da natureza. Isto é o critério de muitos bons criadores como é o caso de Arcadio Pavón Macho, de La
Puebla de Cazalla (Sevilla), que usa um professor
para os canários novos para que estes aprendam
a pronunciar bem as notas e sempre que a genética lhes deia uma boa voz. O professor fica à solta no voador , junto com
os canários novos até que estes passem
às gaiolas individuais, os professores
serão canários muito completos que não tenham galado ou criado em excesso, pois
assim conservam um canto de maior qualidade.
Depois dos canários novos abandonarem o voador já não há grande necessidade de
utilizar o professor. Pondo-se a hipótese que o canto é de melhor qualidade quando aprendido de um exemplar
com potencial evitando-se defeitos no seu canto, depurados previamente pelos seus professores.
Outros criadores expertos, como Joaquín Sandua Sánchez, de San Pedro de
Mieres (Oviedo), sustentam, sem obstáculo, o critério de não usar professores para que o canto que exibirem seja manifestação espontânea
de seus genes e que a aprendizagem não falsifique a expressão dos seus genes, consequentemente,
a seleção que se realize daqueles exemplares com melhor canto corresponderá a exemplares
com um genótipo de mais qualidade. Isto não quer dizer que dois canários com a mesma dotação genética
tenham que exibir uma canção idêntica, já
que o canto, como mostra do fenótipo que é, resulta da interação dos genes com o
meio ambiente, no seu sentido mais amplo (outros sons audíveis, nível
de luminosidade, alimentação, temperatura, sineiros mais ou menos numerosos, disposição
de níveis corretos de testosterona durante a canção plástica, etc.) e é quase impossível
que esse meio seja também idêntico em
ambos os pássaros. Este método de aprendizagem sem professor aplicar-se-ia até
fixar uma determinada linha, logo daria
o mesmo usar professor ou não, posto que a seleção está realizada e a linha fixada. Além disso, a experiencia também nos mostra que o canário que elabora uma partitura
ou canção sem professor tem mais capacidade de improvisar, de tal maneira que a
sua canção nunca é repetitiva, mudando uma vez e outra. Seria útil agrupar os
novos canários por famílias, que tenham uma dotação genética parecida e o seu
canto tenha características similares e evitar
ou atenuar a influência de outros grupos de canários novos de distintas linhas,
alojados em voadores contíguos, que se
possam ouvir e influenciarem-se entre eles,
para isso costuma-se utilizar um rádio que faz de barreira acústica.
Um critério intermedio, mais ecléctico, é o de usar professor na "separação", só até que comece a muda em Julho e os professores
deixem de cantar, assim os novos canários poderão desenvolver a canção
aprendida segundo a sua própria genética durante o resto
do Verão e o Outono. Uma quarta possibilidade, usada também por alguns criadores, é usar vários professores
com canções diversas, todos metidos na "separação" e cada canário aprende
o canto de quem mais gosta ou uma mistura de todos eles. Outros criadores
usam um sistema misto, para sacar novos floreios e novas canções, criam à parte uns quantos casais sem maestros, para que saiam alguns com floreios novos ou canções novas de qualidade, e
os utilizam como professores sucessivamente.
Existem estudos experimentais realizados com outros pássaros cantores, como o
tentilhão zebra, do qual se pode tirar os seguintes conclusões:
1. Um único pássaro criado em
cativeiro com o seu pai imita de forma quase perfeita o canto
deste, mas, quando se criam vários pássaros juntos com um macho adulto, cada um
destes pássaros converte-se, por sua vez, em tutor de seus irmãos e diminui a imitação do modelo do pai, o maior
número de pássaros juntos, menor o número
de sílabas imitadas e menor a duração da canção aprendida.
Os pássaros nascidos mais tarde, em
termos relativos, aprendem do adulto mais
rapidamente que os irmãos mais velhos e com uma imitação mais completa.
2. Os pássaros, dentro da gaiola, aprendem
um modelo de canto mediante "playback",
mas a excessiva abundância deste modelo reduz a sua imitação até uns 33%. Esta restrição de imitação afecta seletivamente as sílabas concretas, não se produz ao acaso, isto faz com que haja sílabas que quase
todos os novos canários imitam e outras que
quase nenhum as imitarão.
3. A criação de canários isolados
socialmente, quer dizer, sós e sem ouvirem modelos de canções de outro adulto, pode dar lugar a um canto improvisado, ainda que atípico, incluindo muitos normais. Embora, esta capacidade de improviso não pareça manifestar-se quando se induza uma menor imitação de um modelo adulto após sobre exposição deste.
4. Se os canários ouvem cantar outro
macho que esteja fora da gaiola, mas sem poder estabelecer contacto visual nem
inter agir com ele, a imitação do seu
canto será escassa ou nula.
Não existem experiências, ainda que estejam em curso, nos que se tem
usado vários modelos de canção diferente e de uma forma
simultânea.
À luz destes dados e em relação
aos hábitos descritos em nossa canaricultura, podemos afirmar o seguinte:
1. Efetivamente, os jovens canários fechados com os seus pais ou outro macho adulto imitam a
sua canção de forma quase completa. A imitação
será menos completa quanto mais canários novos estiverem no mesmo voador e os canários
nascidos mais tarde aprendem a canção dos pais mais cedo que os mais velhos. O uso de gravações reproduzidas dentro do voador
consegue uma imitação quase completa,
paradoxalmente, se os canários a ouvem escassamente, não mais de 2-3 minutos por
dia e se a reprodução é abundante, a imitação
é menos completa.
2. O não usar modelos adultos para que sejam imitados dá
lugar a que os jovens canários improvisem uma canção atípica e com sílabas características. Neste caso, cada canário
serve de tutor a seus irmãos.
3. O uso de um rádio de fundo, soando durante todo o
dia, poderá produzir dois efeitos, primeiro: estimular as vias auditivas do
canto, incluindo o CVS, segundo: servir
abundantemente de estímulo auditivo, conseguindo reduzir a capacidade de imitação
dos jovens canários que o ouvem, isto para o caso do criador pretender que os novos canários não
imitem outros modelos que eventualmente
oiçam. É fácil compreender a ação
estimuladora dos sons sobre as vias auditivas do canto, posto que, de não existirem os ditos estímulos, as referidas vias
se atrofiam de igual modo que uma pessoa surda atrofia os centros e vias
neurológicas da fala o que nunca lhes
proporcionam falar corretamente.
4. A excessiva exposição a sons como o uso do rádio de forma continuada ou aprendizagem em conjunto
com um número importante de jovens canário juntos poderá pôr em marcha processos de seleção na atenção
dos jovens canários para a imitação, aceitando
uns modelos e recusando outros. Isso
poderia explicar a rica diversidade de sons e canções encontrados em pássaros cantores, tanto em ambiente natural como em cativeiro.
CONCLUSÕES
Se bem que existem muitas questões relacionadas com a aprendizagem dos canários cantores, que permanecem
abertas a estudos e experiências, podemos estabelecer as seguintes conclusões:
As características de faculdades e
timbre de voz, por dependerem fundamentalmente da formação anatómica do órgão fonatório
do canário, podem estar determinadas em
grande parte pelo genótipo.
A partitura musical ou canção do canário forma parte do fenótipo
deste e, consequentemente, resulta da interação do genótipo com o meio ambiente, em seu sentido mais amplo.
Ainda que os canários conservem
a capacidade de aprender novas sílabas durante todo o ano, é durante a fase de canção plástica o "período
crítico" da aprendizagem quando mais capacidade tem, em consequência, do
encurtamento deste período, acelera-se a maturidade sexual mediante o enjaulamento
(colocação nas gaiolas de canto) individual precoce ou aporte excessivo de
testosterona, o que poderá conduzir a uma pobreza silábica da canção.
Desconhecemos muitos fatores meio ambientais que podem influenciar a aprendizagem do canto, como aspeto concreto do
fenótipo que é, podendo-se agrupar estes em dois, aqueles que se relacionam com estímulos
auditivos que puderem ou não servir de modelo e aqueles que se relacionam com a
disponibilidade de níveis ótimos de testosterona.
Não é aceite de uma forma geral que aprender com professor se consiga uma canção com maior
riqueza silábica nem com mais musicalidade, ainda que esteja claro que os
jovens canários cantem como os pais, dada a sua capacidade
de imitação. O aprender
sem professor parece que se poderá
conseguir uma canção com, tanta riqueza
silábica e musicalidade como com professor, ajuda-lhe a conseguir novos floreios
e canções que são reflexo de um genótipo adequado, permitindo uma
seleção genética mais acertada, conseguindo uma maior capacidade de improviso, ainda
que existe maior risco da
canção ser de pouco valor e com defeitos na execução do canto. Não haverá inconveniente
em usar professor numa linha, quando
esta já esteja fixada.
Tradução: Diogo Santana
Por : Vicente Jerez Gómez Coronado